sexta-feira, 27 de abril de 2012

Mais uma vez



Só um poeta jogado às lágrimas escreveria uma carta de amor. Fora desse estado, seria um apanhado de palavras repetidas, apenas para agradar o outro ser e cumprir com o protocolo. Mas aquele que chora, aquele que rola, aquele que sente, esse sim escreve uma carta de amor.

Carta essa que nunca chegará ao destinatário. Carta essa que ficará guardada numa gaveta, até que de um lado estejam palavras doídas e do outro, endereços aleatórios, cubos, espirais, e qualquer outra coisa que será desenhada enquanto se fala ao telefone.

Mas é uma carta de amor. É sim. Tem sentimento, tem dor, tem perda. Tem pouco sorriso, pouco amor. Tem desprezo, tem espera, tem angústia. E tem o orgulho. Foi escrita no meio da madrugada.

Cartas sem dor são escritas nos parques, nos escritórios, nos intervalos. Cartas de amor são escritas à noite. Com um cinzeiro cheio de bitucas de cigarro de um lado e um copo com o resto de um café frio e amargo do outro. Cartas de amor têm cheiro de óvulo. Têm cheiro de tensão. Não são perfumadas, e não têm desenhos. Cartas de amor têm apenas dor. Essa dor que passa à medida que as horas passam, à medida que os parágrafos surgem, na mesma proporção que o sono chega.

No final da carta de amor, com os dedos cansados, com os olhos inchados e exausta de olhar pra mesma fotografia envelhecida dentro da gaveta, o sentimento já é de tédio. A carta de amor se transforma em carta de desabafo. E na terceira vez que a carta for lida, a vergonha de si mesma é tanta que o ensaio de um sorriso até aparece no rosto, e aquela risada cheia de saliva que se junta ao chorar aparece.

A vida volta ao normal.

Mais uma vez, o destinatário não a lerá. Mais uma vez, a carta de amor não servirá pra nada. Já me disseram uma vez: ‘cartas de amor são ridículas, se não fossem ridículas não seriam cartas de amor.’ Sim, concordo. Ridículas. Assim como eu. Assim como eu. Assim como eu.

E sim, gargalhadas. Claro.

terça-feira, 3 de abril de 2012

Expurgar

E lá vou eu de novo. Mais uma vez, correndo atrás do que ainda posso chamar de sentimento. Indo atrás de mim mesma, do meu espelho, do meu conforto.

Vou pra preencher alguns espaços vazios e machucados. Vou pra rir verdadeiramente. Ouvir e ser ouvida com o coração. Vou pra ficar em silêncio. Daqueles que só são confortáveis ao lado daqueles que não tememos.

Vou porque preciso dos seus braços, dos seus olhos, do seu sorriso. Vou pra você me chacoalhar e dizer seca e friamente o quanto eu ainda não aprendi nada.

Vou pra ouvir verdades sobre mim mesma. E chorar. E soluçar. E cantar.

Vou porque é só aí, deitada em seu silêncio que eu consigo entender e agradecer um pouco o fato de ter nascido e feito as escolhas que fiz. Foi pra chegar até aí, pra ouvir o pulsar de algo que é eterno em mim.

Vou porque eu preciso, mais uma vez, lembrar que sou capaz de sentir.
Vou porque você é metade. E eu preciso de algo que lembre o que eu sou. Uma vez que estou inexistente. Uma vez que olho no espelho e não enxergo nada.

Preciso enxergar você pra poder me enxergar novamente.