quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Tudo que precisava saber, Alcione me ensinou na infância

Buscando no tio Michaellis o que a palavra ‘LOUCO’ significa, sinto hoje certo alívio ao saber que, além de tudo que já sabemos louco também significa ser solto e livre. E mais, é o mesmo que alegre, brincalhão, ‘folgazão e galhofeiro’ - seja lá o que isso quer dizer. Contudo, a melhor definição pra palavra é ‘fora do comum’, sinônimo de ‘extraordinário’.

Todos acham que sou louca. Eu mesma afirmo isso a cada três dias, pelo menos.

Sou louca de reclamar tanto, ao passo que levo uma vida boa de verdade. Sou louca porque passei 31 anos da minha vida negando a existência de Deus, e hoje afirmo com afinco a magnitude da grande luz da espiritualidade. Louco que é louco acredita em Deus.* Eu não acreditava. Então, fazia parte do grupo de pessoas ‘muito loucas’. Sou louca porque como chocotone com patê de espinafre. Porque numa sessão de terapia, eu acabo sempre aconselhando a minha terapeuta. Porque entendo de futebol e fórmula 1 mais do que meu pai. Porque não me aceito como deveria me aceitar. Porque mesmo sabendo do meu grau de tranqueirice, ainda tento, em vão, fazer amizades com pessoas que julgo normais e equilibradas. Porque pessoas normais e equilibradas não querem amigos loucos. São apenas cordiais e gentis, porém, nunca tentam uma aproximação maior. Têm medo da minha loucura. Tudo bem, isso não me faz mais sofrer. Já me acostumei a isso. Mas, principalmente, sou louca porque sei que consigo entender e participar de todos os grupos de pessoas que conheço, e gosto de pessoas de todos os tipos. Num mundo como esse isso é muita loucura. Ao contrário dessas pessoas, que se soubessem do que passa na minha cabeça de verdade, torceriam o nariz e esperariam a primeira oportunidade para dizerem: ‘nossa, ela é louca mesmo. ’ Mas eu as entendo. Sem problemas. Hoje em dia, já acham que sou louca porque não gosto de histórias de vampiros que fazem sexo no ‘high-school. ’ Porque leio incessantemente. Porque vejo filmes que ninguém vê. Porque ouço músicas que quase ninguém conhece. Sou louca porque só uso AllStar.

Suficiente? A lista não chegou nem na metade. Mas paro por aqui, antes que eu me convença de que não sou tão louca assim - e isso é loucura da mais 'braba'.

A verdade é a seguinte. Passei a minha vida toda tentando ser igual a todo mundo. Tentando me inserir em grupinhos de pessoas que se protegiam pelas suas estranhices. Depois de algum tempo, resolvi que seria diferente. Que minhas tendências me levavam a buscar por coisas fora do ‘ordinário’. Foi aí que resolvi ser ‘extraordinária’. Hoje busco por um equilíbrio, que em conta gotas começa a surgir em minha rotina. Ainda estou longe disso, mas algo que nunca mudou em mim, nem nas fases mais loucas que vivi, é o fato que tento entender e gostar de todo mundo. Algo que aprendi antes de acreditar em Deus. Um sentimento de equalização ‘socialista’ que veio comigo, de outras vidas.

Tentem me entender. Tentem acreditar que pessoas loucas também podem ser legais. Somos limpinhos, educados, estudados. Mas não somos hipócritas e na maioria das vezes, não temos vergonha nenhuma de assumirmos nossas dificuldades.

Mesmo correndo o risco de ouvir um comentário tipo: ‘Nossa, além de louca ela é depressiva. Tadinha! Precisa de tratamento. ’

Sim, preciso de tratamento, assim como o resto do mundo.
A diferença é que louco que é louco sabe disso. O louco que se diz normal, não.

E assim, o mundo vai evoluindo...

Texto publicado em Outubro de 2009.


*Citação de Tati Bernardi no livro: “To com vontade de alguma coisa que não sei o que é.”

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010



E então eu estava lá, trancada no banheiro, chorando e lamuriando por alguma coisa sem muita importância. Passei mais de meia hora lá dentro, até que cansei e decidi sair porque estava com fome. Meu ex-namorado, que cozinhava algo pro jantar, olhou bem pra minha cara e disse: ‘Você escolheu isso. Escolhas são perdas. Não reclame.’

Minha vida mudou desde esse dia. Todas as escolhas que tenho que fazer me obrigam a pensar em apenas uma questão: ‘O que eu vou perder com isso?’ Porque acredito que ‘ganhar’ a gente ganha em tudo que faz, e é sempre algo positivo. Mas nunca nos importamos com o que vamos perder. No começo é sempre mais interessante pensar no que ganharemos. Até que o tempo passa, o que ganhamos já não é mais tão triunfante e invejável, e começamos a nos lamuriar com as perdas.

Mais fácil pensar nelas antes de escolher.

Esse ano, meu principal objetivo foi a minha dieta. Perdi grandes momentos de prazer gastronômico, orgias de glicose e picanha com bastante gordura. Tudo bem. A vida não é tão ruim sem isso, mesmo que agora minha vida tenha cheiro de alface e peito de frango grelhado. Ganhei um guarda-roupa novo, uma cor de cabelo nova e alguns tarados me falando besteira na rua.

Escolhi ler. Chego ao final da jornada tendo lido 18 livros. Sendo os melhores ‘O Evangelho Segundo Jesus Cristo’ de José Saramago e ‘A Elegância do Ouriço’ de Muriel Barbery. Perdi algumas horas de sono dentro dos transportes públicos, algumas horas de ócio total em frente a TV (algo que amo fazer) e ganhei um par de óculos novo.

Escolhi ver filmes de amor. Daqueles românticos mesmo, com final feliz. Perdi um pouco do meu discernimento e dignidade. Tentar voltar a acreditar em príncipes encantados nos emburrece e nos cega um pouco. Encerro o ano com uma lista modesta de 80 filmes vistos. Os melhores: ‘Onde vivem os monstros’ de Spike Jonze e ‘Bastardos Inglórios’ de Tarantino.

Escolhi fazer companhia pros meus pais, continuar cinica e hipocritamente acreditando no celibato, ajuntar dinheiro, passar filtro-solar três vezes ao dia, rezar ao acordar e ao dormir, ter mais amigos heterossexuais, continuar meus estudos filosóficos, científicos e religiosos, não dançar, não reclamar tanto e não me culpar pelas dores do mundo. Escolhi crescer um pouco. Escolhi ser gente grande.

O que eu perdi?

Esse ano de 2010, eu perdi minha adolescência. Essa adolescência que arrastei por mais de 20 anos. Essa fase que deveria ter terminado há 14 anos atrás. Perdi um pouco daquele espírito aventureiro, birrento, impulsivo, luxurioso e orgulhoso. Perdi um pouco da coragem. Mas ganhei o medo. Algo que nunca tive. E isso me mantém mais centrada. O medo me dá a quase certeza que eu escolhi um caminho mais sereno, mais focado e com mais chances de ser bem sucedido.

Que esse medo me acompanhe ao longo do ano de 2011. Que eu continue perdendo em todas as minhas escolhas futuras.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Qualquer semelhança não é mera coincidência

(Era pra ser apenas uma conversa de elevador, sem intenção de nada)

- ‘Feliz dia dos pais’.
- Não sou pai, nem ao menos sou casado.
- Quer um chiclete?
- Mas é o último.
- E qual o problema?
- Se eu chupar, eu não caso.

(Droga,ele falou as duas palavras mágicas, numa mesma frase. Chupar e casar.)


- Não sou supersticiosa.
- Você acha que nos conhecemos por acaso?

(Por favor, páre de me olhar assim, páre de me tocar todas as vezes que passa por mim.)

- Acho que vai chover.
- É, tá precisando. Essa seca tá me matando.
- Tá na seca, é?
- Sim, bastante.
- Quer tomar uma chuva comigo qualquer dia desses?

(Isso é um convite pra um encontro pseudo-romantico-sexual?)


- Só se você me prometer que continuaremos amigos. E que será uma chuva passageira, de verão. E que nunca, em hipótese alguma, alguém fique sabendo disso.
- Fechado.

(Preciso marcar depiladora e pedicure)


- Hoje faz um mês que nos conhecemos.
- O tempo passou rápido.

(Mais uma semana de salão de beleza e minha paciência se esgota)

- Vamos dar uma volta qualquer dia desses?
- Claro que sim, mas essa semana não dá, estou atarefado.

(Preciso desenvolver minha tolerância)

- Essa semana dá?
- Também não.

(Paciência + sabedoria = elevação do espírito)

- Preciso falar com você.
- Pode falar.
- É particular. Preciso te pedir algo.

(Eu preciso de um chiclete. Urgente.)

- Pode pedir.

(Um beijo)

- Me empresta uma grana?

(Filho da puta)

- Claro. Toma.
- Obrigado. Amanhã eu te devolvo.
- Ok, sem problemas.

(Até hoje, sem o beijo, sem o passeio e sem o dinheiro)

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Ainda somos os mesmos

E eu decidi tirar férias de você. Decidi que queria saber como era a vida sem você.

O prazo seria de um ano. Mas a primavera chegou e com ela veio o cheiro do vento, do mato, da falta de chuva, dos almoços ensolarados e fins de tarde gelados. Veio o cheiro do seu hálito. Veio o nosso cheiro juntos.

A reaproximação foi fácil, simples e assertiva. Eu disse oi e você abriu seu sorriso enigmático e me aceitou de volta com apenas um olhar e um aceno de cabeça. A primeira frase da sua boca foi aquela que esperei ouvir por, talvez, toda a minha vida: Eu entendi seu silêncio e te respeitei.

A verdade é que nada mudou tanto assim. Melhorei minha aparência e meu coração. Tive mais tempo pra outros amigos, escrevi mais, li mais, vi menos filmes, falei menos sobre filosofia e critiquei menos a burguesia. Talvez até tenha me inserido nela. Talvez.

Ainda tomo chá todos os dias, durmo com pijama do Piu-piu, minha calcinha favorita ainda é aquela preta sem costura, ainda uso o mesmo All Star roxo e passo os 289 cremes antes de dormir.

Continuo comendo o Cheddar Mc Melt e tomando Coca Zero achando que não vou engordar. Continuo rejeitando peixe cru e cebola na salada. Ainda insisto no celibato experimental. Ainda insisto em me apaixonar uma vez por mês. Ainda sonho com adoção.

E fico feliz de saber que dessa vez quem mudou foi você. É bom te ver mais sério, com mais bagagem, com experiências de quem rodou o país inteiro e viu coisas que jamais terei oportunidade de ver.

Fico grata por você ainda estar do meu lado e me ensinar tanto. Me fazer rir tanto. E não me fazer chorar.
Por você ainda me amar, me respeitar, me admirar e confiar em mim.

Vejamos agora o que iremos aprender um com o outro.
Até que o inverno chegue novamente e nos peça por mais dias de silêncio e perdão.

sábado, 23 de outubro de 2010

Eu e os homens

Nasci no meio de homens. Tenho dois irmãos e cresci no mesmo quintal que mais dois primos. Todos homens. Eles foram meus primeiros amigos, parceiros de traquinices e brincadeiras. Aí eu cresci. E de repente, as mulheres eram estranhas pra mim. Claro, por uma questão de organização e aceitação social, fiz amizade com elas e passei a conhecer um pouco mais das suas obscuras e dramáticas realidades. Tudo bem, nada mal. Tínhamos muitas coisas em comum. Ah, sim, eu também era uma delas.

Meu pai e meu irmão mais velho sempre foram fãs de Madonna. Eu tinha 10 anos quando meu irmão ganhou o disco ‘True Blue’, e o ouvia todos os dias. Aos 15, eles assistiam muitas vezes seguidas o show ‘Blond Ambition Tour’. E eu ouvi muitos comentários do tipo: ‘Eu admiro mulheres como a Madonna’. Fudeu. Quis ser Madonna pro meu pai e meu irmão me admirarem. Fudeu mesmo. Assisti 1298 vezes ‘Truth or Dare’, e no mesmo ano eu arrumei meu primeiro grupo de amigos gays.

Amo rodinhas de amigos falando de futebol e bunda. Acho engraçadíssimo a forma que eles enxergam o mundo, e a forma prática de se resolver questões que nós mulheres levamos dias pra começar a pensar. Eles não precisam de chocolate, não tomam fluoxetina, fazem xixi em pé e em qualquer lugar, e abrem potes de azeitona como ninguém. Deve ser fácil ser homem.

Gosto muito de sexo com homens. Sou apaixonada pelo falo. Mas na minha opinião, acho que homens bissexuais fazem sexo melhor do que heterossexuais. Minhas amigas acham que é porque eu ainda não conheci um homem de verdade. Um que vai me tirar do sério e me deixar de quatro feito uma shitsu treinada e obediente. Talvez seja por isso que todas as vezes que copulei com um homem heterossexual sempre foi na mesma condição ‘somos amigos e estamos fazendo sexo, não espere nada de mim’.

Amei homens que me faziam competir com outros homens. Lembram da minha infância? Pois é. Não aprendi a competir com mulheres. Tenho medo. E claro, me sinto inferior a pelo menos 98% delas. Não deveria mesmo me sentir assim. Mas sou mulher, e sou complicada.

O que é realmente bom de estar no meio dos homens é que eles nunca tentam me descomplicar, me definir e me escutar. Porque a mulher sou eu, e eu faço tudo isso com eles.

Sim, sou mulher, egoísta, complicada, egocêntrica e com baixa auto-estima.

Mas acredito em Deus. E sei que, dentro de Seus planos eu sou assim porque preciso aprender alguma coisa com isso. Um dia eu descubro o quê.

E Deus é tão espertinho que colocou 33 homens juntos no Chile, e todos saíram se abraçando depois de 67 dias presos num buraco. Isso ratifica minha teoria doidinha.

Imagina se fossem 33 mulheres?
O fim poderia ter sido beeem diferente.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Ensaio de uma vida de merda




Eu tenho um blog. (Dãh)
Sou seguida no twitter.
Sou vista e opinada no facebook.
Inacreditavelmente ainda tenho um perfil no orkut.
Estou no linkedin.
Tenho dois MSNs.
Sou cliente prata do par perfeito.

Como sempre eu me pergunto: Pra quê? Será que precisa de tanta coisa assim só pra dizer que eu tenho uma vida de merda?

Sou pseudo-escritora. Devo ter mais textos que leitores hoje em dia. Não sei pra que ter tantas páginas com as minhas experiências e opiniões se a cada dia chego à conclusão de que minha vida é a coisa mais ordinária que eu conheço. A mais merda, a mais fétida.

É um agregado de memórias esfumaçadas na minha mente. Um passado distante, mas que ainda inspira textos e frases de até 140 caracteres.

Mas o presente é rotineiro. É igual. Sempre.
Nada a reclamar de verdade. Nenhum problema realmente sério. Família, dinheiro, amigos, vida social, trabalho, espiritualidade, amores, tudo bem, tudo estável.

Reclamo do calor. De fome, da chuva, de cansaço, do cheiro no ônibus, do último filme ruim do Shyamalan, de gente que pensa diferente de mim, de paqueras mal-sucedidas, e de falta de sexo. Nada que realmente importe de verdade. Futilidades de alguém de vida estável.

E onde então se encontra aquela mulher ‘doidona’, que tem frases de efeito, boca suja e sempre dá a entender que passou a noite numa suruba de 390 pessoas bezuntadas em azeite de oliva? Hein?

Pra que manter essa imagem? Na vida real eu sou apenas aquela menina sozinha lendo um livro num canto escuro de uma cafeteria. Sou aquela que foge pro Ibirapuera no meio da tarde quando precisa ouvir o silêncio. Sou aquela que come chocolate escondida, achando que assim não engorda. Sou aquela que chora enquanto toma banho. Sou aquela que reza duas vezes por dia, e quando esquece tem medo de ser punida.

Caralho. Eu sou normal. Minha vida é normal.

E o que está fora do lugar então? Por que me sinto tão diferente?
É diferente por dentro.
É fácil ser diferente agindo de forma diferente, se penteando diferente, se vestindo diferente. É simples.
Difícil é ser diferente agindo como um normal, tendo uma vida regrada, um trabalho corporativo, e participar de uma comunidade religiosa.
É conseguir viver em sociedade, aceitar o mundo que vive, respeitar as vidas alheias, e mesmo assim ser diferente, pensar diferente, ter opiniões diferentes.

Minha vida é de merda, é sim. Como a de todo mundo.
Sempre lutei contra isso, nunca achei que teria uma.

Hoje eu gosto dessa merdinha que vivo. Dessa rotina cheia de planejamentos metódicos e assertivos. Desse dinheiro controlado, e horários marcados. Essa merda de rotina me faz bem.

Resignação.

Eu aceito minha vida de merda.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

A síndrome do banheiro público




Quem já teve dor de barriga dentro de um ônibus e desceu em qualquer ponto pra usar qualquer banheiro em qualquer boteco em quaisquer condições de limpeza, põe o dedo aqui.

É assim que eu defino a maioria das minhas participações sexuais na sociedade. O tal banheiro público.

Não de forma degradante ou de extrema baixa autoestima, mas de forma realista. Tão realista a ponto de poder falar abertamente sobre isso e saber que a solução já foi encontrada e executada.

Sempre me senti um ícone do mundo do ‘sexo sem compromisso mas com responsabilidade’. Hoje percebo que nada mais fui do que um refúgio. Um alívio. Taí a síndrome.

Certa vez, numa típica conversa pós-coito, meu parceiro me abraçava ternamente e dizia com o maior romantismo: ‘Me sinto tão bem quando venho aqui, não aguentava mais o stress do escritório. Me sinto aliviado.’ A minha resposta veio impulsivamente: ‘Me senti um sanitário de metrô agora.’ E ele, depois de uma crise de riso disse: ‘Faz sentido. Mas por que não um sanitário de shopping?’ ‘Oras, antes de decidir vir correndo pra cá, você estava mais no estado de quem tá na rua apressado tentando chegar ao trabalho e de repente tem uma diarréia, do que alguém que está fazendo compras num sábado à tarde.’ Depois da segunda crise de riso, minha reação foi óbvia. ‘Agora se limpe e vá embora correndo, porque você já conseguiu o que queria e precisa continuar sua vida.’ Foi o fim de nossa breve história que durou 3 encontros e um telefonema, momento em que enterrei a vontade de tê-lo como um namorado definitivamente.

A novela foi a seguinte: mesmo depois de ter mandado ele embora, uma semana depois me senti entediada e decidi ligar pra ele. Queria que viesse em casa pra me entreter. Ele disse em poucas palavras que não poderia mais vir à minha casa porque tinha encontrado o amor de sua vida e tinha decidido começar a namorar. Terminou com um mero: ‘Eu sou fiel, sabe?’

Foi o início da elaboração da minha teoria sobre essa síndrome. Eu era o banheiro público, ela era o banheiro de casa e ele era do tipo que o intestino travava quando estava numa viagem e só conseguia destravar quando voltasse.

Passei mais alguns anos me debatendo dentro desse sentimento, até que decidi aceitar a posição de ‘banheiro de balada’. Normalmente, aonde as melhores histórias acontecem, mas que no dia seguinte não passam de vagas lembranças e fofocas cheias de veneno.

Depois, encontrei alguém que seria capaz de morar dentro de um banheiro se fosse preciso, mas que só usaria o vaso sanitário do vizinho.

Passada essa fase, me tornei um banheiro entupido.

Daí, meu banheiro ficou interditado. Teve uma placa pendurada na porta dizendo: ‘Desculpe o transtorno. Estou em reforma pra melhor atendê-lo’ por muito, muito tempo.

Acabei de tirar a placa, e realmente espero em breve ser útil de novo. Mas o reabro reformado, limpo, redecorado e pronto pra alguém.
Não vou dizer que já sonho em ter alguém morando lá dentro, nem sei se a reforma está realmente acabada a ponto de servir de moradia. Mas quero alguém que prefira usá-lo, não por falta de opção, pressa ou desespero.

Simplesmente escolha.

sábado, 21 de agosto de 2010

Less is more.

Essa história toda de mais ou menos sempre me deixou encafifada. Aliás, várias coisas me fazem parar pra pensar. Até as mais idiotas, tipo aquele da Tostines (fresquinho, compra mais) lembram? Aí, vem sempre alguém que fala ‘menos é sempre mais’, com aquele ar de “quero chocar o grupo”. Quando ouço isso, sempre dou risada, faço aquela cara blazè e finjo que sou surda dos dois ouvidos e esqueci a prótese em casa. Mas a frase fica na minha cabeça, e vai me deixando nervosa (sou neurótica, e você já deveria saber disso antes de fazer essa cara de susto).

Em resumo, eu concordo que menos é sempre mais. Sou minimalista pra várias coisas. Em termos de cores de roupas e calorias no verso da embalagem, menos é sempre melhor. Aceito o nada em várias situações, mas na maioria das vezes, em gordura trans, sódio, álcool e sexo.

Agorinha mesmo, ao terminar meu ritual de hidratação, pensei comigo mesma: ‘um dia a menos’. Pronto, a palavrinha apareceu aí no meio. Menos. Parei pra pensar um pouco, e tudo começou a girar ao meu redor. O que seria mais deprimente do que pensar isso?

Se já não bastava tudo que rodeia minha vida emocional, eu ainda tenho que dormir com a sensação de que não fiz nada do que deveria. Um dia perdido.

Um dia a menos pra eu fazer alguma coisa útil, além de pensar em mim mesma e nos meus problemas tão pequenos e infantis. Um dia a menos pra eu parar definitivamente de fumar. Um dia a menos pra eu tomar coragem e começar a trabalhar com voluntariado. Um dia a menos pra eu viver um grande amor, ou pelo menos pra eu tentar me apaixonar de novo, sem aquele medo ridículo de ‘quem ama sofre, quem sofre se fode, quem se fode não ama’.

Acho que uma das minhas buscas sempre foi ‘o dia a mais’. No sentido bem quantitativo mesmo. Um dia a mais de experiência, de perdão, de caridade, de amor, de entrega. Um dia a mais que eu ganhei nessa encarnação porque eu mereci ganhar esse dia. Um dia a mais ao lado dos meus pais, dos meus irmãos e amigos. Um dia a mais de leitura, de bons pensamentos, de boas tentativas.

E na questão de conhecimento? Você arriscaria um alternativa?

Menos conhecimento, menos sofrimento. Mais conhecimento, mais sofrimento. Menos conhecimento, mais sofrimento. Mais conhecimento, menos sofrimento.
Eu escolhi conhecer mais. Nem que para isso eu tenha que sofrer mais.

Porém, se amanhã você me encontrar na rua e perguntar como estou, não se assuste se eu responder com uma boca torta: ‘eu tô bem mais ou menos’.

sábado, 7 de agosto de 2010

Literaturizando

Se você fosse um livro, que livro seria?


Eu sei que nunca deveríamos responder uma pergunta com outra pergunta, Chavez já me ensinou. Mas uma pergunta dessas, assim, do nada e dentro do ônibus? À essa hora? Numa segunda-feira? Quanta coisa passando pela minha cabeça, e você olhando pra mim com esses olhos inchados de início de semana. Eu pensando, e você me olhando. O melhor que consegui fazer foi, claro, outra pergunta: Pode ser uma cena? E você me olha de novo, dessa vez já desperto, e me diz entediadamente: Sim, mas você ainda tem que me responder a outra pergunta.


Eu sou o Joey do seriado Friends, guardando Little Women no congelador, porque está muito triste com os acontecimentos do livro.


Mais alguns minutos de silêncio e eu continuo pensando. Você tenta, como sempre, preencher os nadas entre a gente e começa um texto engraçado: Olha, desde que começamos a pegar esse mesmo ônibus, já vi você lendo uns vinte livros diferente. Já me assustei bastante com as suas escolhas. Lembro que o primeiro livro que vi nas suas mãos foi Trópico de Câncer, do Henry Miller. Fiquei impressionado, pois você lia como se estivesse dentro da história. Naquela época você não sabia que eu existia. (E na minha cabeça, passava frases do tipo: bobinho, eu já tinha até prestado atenção nas suas axilas!) Depois disso, não me lembro da ordem, mas começou a aparecer Milan Kundera, epopéias de médicos medievais, Kerouac, Saramago, Bukowski, entre outros. Realmente acho que não será dificil escolher um livro que mais se parece com você.

Eu quebro seu texto com mais uma pergunta: Quais foram os sustos que você levou? Ah, John Grisham, porque é muito diferente do que você sempre leu, e de uns tempos pra cá, andam aparecendo uns livros Espíritas. Me assustei porque não imaginava que você tinha uma religião. Sempre imaginei que quem lêsse esses escritores malditos dificilmente acreditava em Deus. Mas o que me deu coragem pra iniciarmos uma conversa foi ter visto você lendo um livro sobre a Ferrari. Aí eu pensei comigo mesmo: Não é possível. Isso não é possível. Eu começo a rir com tantas revelações, e você, como sempre, não entende porque dou risada. Enfim, digo: Diante das suas constatações, uma pessoa que lê tanta coisa diferente nunca conseguiria responder a sua pergunta. Eu estava pensando em responder algo bem utópico, tipo, ‘eu sou a biblia’. Mas seria pretensioso demais. E nesse momento você começa a falar mais rápido, pois a sua parada está próxima. Você vai me deixar esperando uma semana pra saber a resposta? Eu concordo com um sorriso, silenciosamente. Você fica com um olhar irritado, e diz, como todas as segundas: Então, uma boa semana pra você. Algum filme pra me recomendar? Eu te recomendo ‘Um Homem Sério’ (Coen Brothers) e você diz que já viu. Então eu digo que não tenho mais nenhum pra te indicar e você já está parado nas escadas, esperando a porta abrir. Você me dá um tchau, e sai andando sem olhar pra trás.

O dia já está quase amanhecendo e eu aproveito pra continuar lendo. Abro ‘Comer, Rezar e Amar’ e a primeira frase que aparece é ‘Não toque em nada que não seja você mesmo’. Agradeço Elizabeth Gilbert, agradeço o universo pelo nosso diálogo, guardo o livro na bolsa e fecho os olhos.

Finalmente, silêncio.

terça-feira, 27 de julho de 2010

O carvão. O diamante.

A: O que você faz aqui? Esse não é o seu lugar.

B: Nasci aqui. Não foi escolha. Aqui devo ficar até ser útil à alguém.

A: Mas você é muito sujo.

B: Você está aqui sozinho. Posso ser sua companhia.

A: Estar sozinho é a minha natureza. Você não deveria estar em seu grupo? Detesto carência.

B: Sim, normalmente estou em grupos. Mas por algum motivo a natureza nos deixou aqui, sozinhos e juntos.

A: Soube que há outros da minha família espalhados por aí. Mas sou precioso demais pra sair em busca deles. Eu me basto.

B: Família? Somos igualmente minérios.

A: Eu sou eterno. Você é provisório.

B: Sou provisório porque sou muitos. Somos numerosos porque somos essenciais pra sustentação humana.

A: Eu sou único. Um de mim vale duzentos mil de vocês.

B: Duzentos mil de mim aquecem uma família de dez pessoas por toda a vida.

A: Um de mim sustenta uma família inteira em todos os aspectos.

B: Se engana quando pensa assim. Pra sustentar uma família inteira em todos os aspectos, devem trocá-lo por dinheiro. Você deixaria de existir na primeira necessidade.

A: Você também. Se te queimarem pra acender o fogo que providenciará o alimento, você vira cinza e desaparece.

B: Dois pontos: Eu desapareço, e imediatamente outro ‘mim’ virá cumprir minhas funções. Não desapareço, pois vou ser devolvido pro planeta, e com certeza terei outra função.

A: Você suja, faz fumaça, e queima. Eu enfeito, dou estatus e poder.

B: Eu sirvo de base pra qualquer pintura em tela, minha fumaça pode até ajudar os humanos a se comunicarem e ardo em chamas pra aquecê-los numa noite fria.

A: Sua fumaça dá câncer.

B: Seu poder mata e manda matar. Temos a morte como consequência. A diferença é o motivo.

A: Se somos tão diferentes um do outro, por que estamos aqui juntos? A natureza é cruel.

B: A natureza é sábia. Somente somos diferentes porque você assim o quis. Nessa escuridão temos a mesma cor, e pra terra que nos sustenta aqui, pouco importa o seu brilho e sua cor, pouco importa minha sujeira e minha fumaça. Aqui apenas preenchemos espaços.

A: Até algum humano me encontrar e eu ter a satisfação de proporcioná-lo o melhor dia de sua vida.

B: Mas se esse homem estiver faminto, e precisar de fogo pra aquecer sua caça, garanto que ele me escolherá. E eu proporcionarei à ele o melhor dia de sua vida.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Você tem fome de que?

Estando num período de reeducação alimentar, me fiz essa pergunta hoje pela manhã. Respostas vieram incessantemente à minha cabeça. Como todos já devem ter percebido, sou uma criatura de gostos e opiniões peculiares. Seria estranho responder apenas: tenho fome de comida.

Tenho fome de conhecimento e habilidades, a ponto de saber fazer crochê e tricô (e me orgulhar disso). Minha fome é neurolinguística, pois quero sempre falar apropriadamente em cada situação, mesmo tendo interlocutores de níveis extremamente diferentes. Cosmogônica, pois em qualquer momento do dia ou da noite, paro pra pensar no universo, em sua criação e evolução, e na minha pequenez demasiadamente humana. E é fisiológica, claro. Eu sinto vontade de comer Nutella todos os dias.

Porém, toda minha fome ultrapassa algumas barreiras, e ao me referir à ‘fome de conhecimento’, me refiro também à fome pelo desconhecido. Por exemplo, desconhecia o prazer carnal e confesso que experimentei todas as suas lícitas formas. Desconhecia a independência, e fui atrás dela lá nos EUA. Desconhecia o universo corporativo, e hoje me encontro perfeitamente inserida nele.

Tenho fome de vencer. Mas vencer o quê e de quem? Vencer o orgulho, o egoísmo, a vaidade e meus maus hábitos. Vencer de mim mesma.

Constantemente sinto fome de arte em geral, de boa leitura e de bons pensamentos.
Às vezes, sinto saudades daquela fome exacerbada e exagerada do pós-coito.
Desenvolvo aos poucos minha fome pelo voluntariado e pelo altruísmo, mas como já mencionei antes, preciso primeiro vencer meu egoísmo.

Concluindo, minha reeducação alimentar me fez refletir mais sobre mudanças interiores do que as exteriores. Sei que isso soa estranho, mas concluo que hoje em dia tenho fome de mim mesma.

“Dizem que somos o que comemos. O que aconteceria se eu comesse a mim mesma?”
Um dia me fizeram essa pergunta, e creio que estou muito próxima de encontrar a resposta.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

O GRITO



Esse é um grito de socorro.
Um grito de frente o espelho, de mim pra mim mesma.

Sou gorda. Sou gorda. Sou gorda.

Com o agravante de ser baixinha, alternativa, esquisita e japonesa, nada poderia ser tão constrangedor e minoria.
No auge da minha maturidade feminina e espiritual, isso deveria ser apenas uma piada. Mas não é. Frases do tipo: ‘gordo não escova os dentes, pois eu nunca vi um numa propaganda de pasta de dentes’ já não fazem o mesmo efeito que sempre fizeram. Resumindo, não acho mais graça ficar fazendo piadas de gordinha só pra justificar minha preguiça e falta de disciplina.
Gastar o triplo em lojas como Palank não me deixam com a auto-estima elevada. Comprar apenas sapatos e bolsas pra suprir meu desejo consumista, desde que não posso usar tudo que está na moda não é mais tão divertido assim.
Por outro lado, comer fast-junk-rotten food, marcar presença em feijoada de amigos, convidar todo mundo pra tomar um café na Paulista, tem se tornado uma rotina na minha vidinha calórica.
Assumo que não sou uma pessoa tão feliz o tempo todo quanto aparento, não sou tão sorridente assim, não sou engraçada, não sou tão boazinha como acham que sou. Sou apenas uma gorda que busca defesas pra não ser chamada de chata. As pessoas não toleram gordos chatos.

Já houve fases em que emagreci bastante, e pude perceber o quanto esse mundo é cruel. Nessas fases, tinha mais admiradores, ficantes, sex-buddies e convites para festas. Não, não sou fútil a ponto de pensar que ter tudo isso é realmente importante. Mas entendo que só tive tudo isso porque me sentia melhor. Porque me amava um pouco mais. Então, estou oficialmente dando um basta no pensamento: “Me amo porque sou magra.”

Quero ser magra por me amar.

Nada radical. Nunca vou ajuntar dinheiro o ano todo pra fazer uma lipoaspiração. Nunca vou deixar minha vida social de lado para correr numa esteira. Nunca vou relacionar o fato de estar solteira com o fato de não ter o corpo à lá Ana Hickman. Sou interessante a meu modo, tenho cultura o suficiente pra sair bem em qualquer situação, e tenho amigos maravilhosos que me fazem esquecer de problemas de cunho esteta.

Tenho fé.
E é exatamente essa fé que me faz querer cuidar melhor do meu corpo, ingerir alimentos que contribuam com meu bem-estar. Assumo um compromisso comigo mesma, oficialmente, de que a partir de hoje, me cuido porque me amo – até então, me cuidava pra alguém me amar. Essa é a diferença. É isso que chamo de maturidade.

Comprei ração humana (argh), fiz minha matrícula na academia do bairro, e vou trocar minha viagem de férias por algumas semanas num SPA. Digo adeus ao Mc Donald’s, ao Burger King, à feijoada do Ricardo, aos doces da Dona Sônia, e aos bolos trufados dos aniversariantes da firma. Digo adeus à minha baixa auto-estima, à minha preguiça e à minha falta de disciplina.

E prometo a mim mesma não me tornar uma patricinha chatinha consumista e sem cultura no dia em que me tornar magra e prometo não esquecer o meu passado.

O problema vai ser quando eu perceber que ser gorda nunca foi um problema. Mas só sendo magra que vou saber.

Boa sorte pra mim.

quinta-feira, 18 de março de 2010

“May I have a cup o gold, please?”

Sou brasileira e amante do futebol. Nada mais clichê e previsível de que, em ano de copa do mundo, tudo gire em torno dessa paixão animalesca e irresistível.
Tornamo-nos patriotas, juízes ridiculamente fantasiados e até o mais descrente ritualiza todos os ‘esperados’ sete jogos do mês de Julho.
Dias atrás, conversava sobre: ‘O que você estava fazendo quando...’ e percebi que não me lembro muito bem de quase nada. Tipo, não tenho idéia do que fazia quando Lady Di, Mamonas Assassinas e Isabela Nardoni morreram. Mal me lembro do que fazia quando Michael Jackson desencarnou.
Incrivelmente me lembro de algumas copas do mundo. O que me deixou feliz e surpresa, pois percebi que minha memória retém mais momentos felizes do que fúnebres.

Vi meu pai chorando pela primeira vez em 1986, logo após Zico ter perdido um pênalti. Lembro que nossa seleção era favorita absoluta. Acho que 86 foi um ano determinante na minha ligação com o futebol, pois algo que havia feito meu pai chorar deveria ser realmente importante.

Já na adolescência, lembro-me que foi extremamente divertido confeccionar bandeirinhas pra decorar a rua e arrecadar fundos pra comprar tinta e pintar calçadas. Não liguei muito pra eliminação do nosso time, talvez porque em 1990 ainda não sentia direito a rivalidade contra os argentinos. Foi divertido passar as noites nos dividindo entre decorar e brincar de salada de frutas. Sem esquecer de que destruir toda a decoração foi mais divertido do que prepará-la. Descobri minha tendência esquerdista, apesar de tê-la realmente aflorada quase dez anos depois.

Em 1994, eu e minha prima Emi, eterna companheira, passávamos mais tempo no Cine Olido, no KFC e em sebos no centro da cidade do que em frente da TV vendo futebol. Com exceção das finais, que ritualizamos um tal de patê de atum e acreditamos que foi ele o responsável pela conquista da taça. Ridiculamente, assisti a maioria dos jogos ajoelhada, coisa que nem sonho em fazer hoje. A hérnia de disco não deixaria. O país inteiro deveria agradecer até hoje o patê de atum, meus joelhos e claro, Roberto Baggio.

Achei que não teria muito que fazer na copa de 98, pois morava nos EUA, onde o esporte não era nada conhecido. Apenas me esqueci de que morava numa comunidade de imigrantes, trabalhava num restaurante italiano e dava aulas de inglês para brasileiros. O cenário da grande final foi inesquecível, com a trilha sonora de (urgh!) Ricky Martin, num genuíno churrasco brasileiro, muitos brasileiros bêbados ao redor de uma piscina e um francês charmosíssimo entre nós.
O ‘tal’ francês, talvez, tenha me tirado o recalque que sentia pelo país, mas nunca me fez esquecer de ter visto o Empire State Building coberto com as cores da França. Estávamos tão bêbados que nem choramos. Fomos correndo pra uma balada na Christopher St., e muito xingados pela bagunça que causamos na redondeza. O álcool me fez esquecer de todo o resto da noite, mas me lembro muito bem de onde acordei e ao lado de quem...

Já de volta ao Brasil, morando sozinha, dando aulas no CNA, vi todos os jogos que se passavam no meio da noite. Lembro-me que minha prima Emi vinha em casa e trazia uma corneta barulhenta que acordava a gente e toda a vizinhança. A copa de 2002 foi surpreendente, pois estava prestes a tatuar no braço ‘Felipão, leva o Romário’ quando o decisivo (e na época magro) Ronaldo nos presenteou com dois gols na final. Nesse mesmo ano, perdi minha vesícula e um pouco da minha dignidade.

Construí minha pequena comunidade anarquista, tinha uma escola de inglês e alguns amigos bêbados jogados no chão da minha casa. Esse foi o cenário da desastrosa copa do mundo de 2006. Já tinha adquirido uma prótese de titânio na coluna, me preocupava intensamente com o câncer de mama da minha prima e chorava um amor perdido. Uma copa mais amena, menos revoltante, com outras prioridades, porém com a mesma raiva da França, e conseqüentemente de Roberto Carlos, que fez 200 milhões de conterrâneos chorarem ao arrumar sua meia em momento impróprio. Sei que não foi culpa dele, mas no mundo do futebol é sempre tradição culpar uma única pessoa por toda a desgraça.

24 anos se passaram desde a primeira copa que me lembro até a desse ano.
Impossível não me sensibilizar com as mudanças e desdobramentos da vida. Nesse ano de 2010, inacreditavelmente a África do Sul sediará um evento desse porte, eu celebro 10 anos sem álcool no organismo, celebro a solterisse, o retorno a casa de meus pais, amigos queridos e uma vida menos anarquista e mais corporativa.
Nessa copa, não mais terei a companhia de minha prima, pois esta já foi pro outro lado esperar por mim. Não terei meu amor ao lado, pois este também celebra o retorno ao seu lar.

Tudo mudou menos a vontade de gritar “HEXACAMPEÃO”, de comer pão com patê, de decorar a rua com temas da copa e celebrar o mais apaixonante e democrático de todos os esportes – a merda do futebol...

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Querer é poder? Precisar é conseguir?

Quero:
Falar um melhor japonês, escrever um melhor português, fazer 10 sessões de drenagem linfática, fazer uma lipo, ser amiga do Selton Mello, aprender a jogar xadrez e ler tudo que existe de Bukowski.

Preciso:
Perder alguns kilos, parar de fumar, voltar a acreditar no amor, voltar pra academia, parar de ser tão ‘nerd’ e um ar-condicionado.

Preciso mas não consigo:
Dirigir, nadar, arrumar meu guarda-roupa, entender a maternidade e participar de eventos que não combinam comigo.

Quero mas não preciso:
Um apartamento minimalista, pay-per-view do BBB10, sexo, ir a uma corrida de F1, ir a um jogo da Libertadores e aprender a falar francês.

Quero porque sou mimada, infantil e egoísta:
Que meus pais me dêem atenção o dia todo, que minha mãe faça temaki todos os dias, um edredom com estampa de flor de cerejeira e que meus amigos digam que me amam.

Preciso porque sou consumista:
Assinatura da Bravo, a coleção completa em DVD do Tarantino, a coleção completa dos livros de André Luiz e o Pentateuco de Allan Kardec, um laptop ‘super-mega-power’, o livro Sex da Madonna e um PSP.

Quero porque eu tenho 32 anos, e já está na hora:
De envolver-me emocionalmente de verdade, de conhecer a Europa, a Ásia e a África, de parar de reclamar tanto, de ter mais amigas heterossexuais, de voltar pra Nova York e de começar a pagar o INSS.

Quero mas não consigo:
Gostar de filmes ‘Blockbuster’, parar de comer tanto ‘fast-food’, parar de entrar em salinhas de bate-papo da UOL, parar de comentar bobagens em comunidades do Orkut, ser vegetariana e parar de achar que Roxette é legal.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Mulher Solteira e Cansada Procura

Estou cansada. Fato.
Meu cansaço beira a exaustão. Juntem cansaço com paranóia e o resultado é sempre o mesmo: mulher, mais de 30, sem filhos, solteira e que só se fode na vida, principalmente em questões amorosas.
Me cansei dos homens. Tenho preguiça deles. Cansei do ‘nhenhenheismo’ da hipocrisia masculina. Cansei de tiozões tarados e jovens precipitados, afinal de contas não há diferença entre eles.

Cansei da necessidade masculina de arrumar namoradas que impressionem seus amigos. Cansei de homens que dizem A-D-O-R-A-R mulher de personalidade e opinião, mas que sempre se apaixonam por mulherzinhas manipuláveis e submissas.
Porque sim, existe um abismo entre a mulher e a mulherzinha.

Estou cansada de homens com medo de mulher de verdade. Daquelas que não foram treinadas pra serem mulherzinhas. Daquelas que assumem que são hedonistas e onanistas.

Estou cansada de homens cheios de informações fragmentadas. Que juram que lêem Sartre, mas que no fundo no fundo adoram ver um bom Rambo e sonham em encontrar uma cachorrinha Lessi pra chamar de sua. Mas que na frente da mulher de verdade só sabem fazer coisas como: reclamar, se gabar ou pedir por sexo. Eles se gabam de seus carros e suas viagens. Adoram ficar horas e horas falando de como o Chile é lindo na lua-de-mel.

Estou cansada de homens que ADORAM viver a modernidade, mas não sabem o que fazer quando se deparam com uma mulher moderna de verdade. Tratam-na como se fosse uma desesperada, têm medo da opinião alheia e literalmente, ainda não aprenderam o que é ‘a night stand’ com uma mulher de opinião. Fogem, mas fogem tão rápido que não dá tempo nem de mandá-los a merda.

Cansei dos chatinhos, charmosinhos, cheirosinhos, perfeitinhos, emos, rockers, milfuckers, knockers, motherfuckers, proletários, punheteiros, maconheiros, confusos, curiosos, republicanos, corintianos, pagodeiros, micareteiros, estetas, ignorantes, idiotas, viados, fashionitas, pirocudos, bombados, tarados, pseudo-intelectualizados, nerds, cools, legaizinhos, evangélicos, viciados, contrariados, bêbados, mal amados e mal dormidos. Cansei, cansei, cansei.

Hoje procuro por um homem cansado como eu. Mas que não se canse de mim.

Uma mulher cansada da verdade.
De verdade.

domingo, 31 de janeiro de 2010

TOOL ME

Sou aquele alicate de unhas mal-afiado, que deixa as unhas mais bonitas, porém as faz sangrar.
Sou também aquele último fósforo da caixa, que acende bem o cigarro e o fogão, mas se precisar mais acabará queimando os dedos.
Sou o sapato velho, cheio de buracos, sujo e fedido, porém sou a melhor opção nos dias mais cansativos.
Sou aquela esteira, que chegou como a solução de problemas, e hoje é apenas um lugar onde se estica o casaco molhado.
Eu sou o primeiro computador. Aquele que revolucionou vidas, mas ao ser comparado aos de hoje, apenas envergonha.
Sou um caderno de caligrafia, onde todas as páginas estão preenchidas.
Às vezes sou aquela fita VHS, onde está gravado o último capítulo de uma novela.
Sou um bicho de pelúcia velho, que ao olhar, traz lembranças lindas, mas ao chegar perto, faz espirrar.
Sou um carro conversível em dias de chuva.
Sou alimento perecível pós-vencimento.

Sou apenas um reflexo.

Portanto, trate-me como um espelho quebrado. Que além de dar sete anos de azar, ainda dá muito trabalho pra se jogar no lixo.

domingo, 10 de janeiro de 2010

Fui para o interior.

Brinquei de mês, pulei corda, abri gaiolas.

Até apanhei da minha mãe, com aquela vara de pescar do meu pai.

Mas, não me machuquei e me escondi embaixo da cama pra ela não me alcançar.

Coloquei pés e mãos na terra vermelha e úmida.

Cantei.

Dancei.

Chorei.

Chorei por descobrir que meu interior já havia se esquecido de tudo isso.

Chorei por ter tido a sorte de ter pessoas que me fizeram lembrar esse meu interior.

Mesmo sendo um interior tão triste.

Até onde você mostraria o seu?

(Texto de apresentação da peça teatral 'Interior' do grupo Tusp)