segunda-feira, 20 de junho de 2016

Da palavra

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Algumas horas antes d’ela seguir caminho, ela escreveu sua última palavra – resiliência.

Ela, genial como sempre foi, resumiu todo o passado, o momento presente e seu futuro eterno em uma única palavra. Nada representa melhor o que ela fez. E toda a mensagem que ela quis deixar ficou nessa única palavra. Foi isso que ela deixou pra nós. Uma palavra.

Desde então, passei a procurar a minha palavra. Revirei livros, cadernos, notas, coisas da época da faculdade. Achei algumas, chorei com outras, amei a maioria. Mas, como tudo na vida, não é procurando que se acha. Você simplesmente tropeça naquilo que você precisa. As coisas aparecem e acontecem na hora certa. E foi assim, desse jeito que ela apareceu. 

Grata por ser de um idioma que faz parte das minhas raízes. Grata por ela ter saído do coração de alguém que me ama incondicionalmente. Mais grata ainda por eu ter finalmente entendido o que ela significa. E eu a ouvi desde o dia que nasci.

As coisas que precisamos estão todas ao nosso redor, perto da gente. Contudo, só as reconhecemos no momento certo, na hora que estivermos prontos pra entender.
Essa palavra resume o que eu vim aprender aqui. Nesse mundo, nessa vida. E é isso que eu vou deixar todas as vezes que tiver que seguir caminho.


“GANBATTE”

sábado, 4 de junho de 2016

Do meu último ano - do meu coração rebelde

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Ouvi Chandelier da Sia todos os dias. Religiosamente. Por quê? Não sei. Só sei que ouvi. Sissy that walk da RuPaul foi a música que eu ouvi todos os dias pela manhã, exceto no período que morei fora. Lá eu ouvia o que os outros estavam ouvindo. Era hora de conhecer coisas novas.
Foi o ano de Rebel Heart e de chorar ouvindo True Blue ao vivo depois de tantos anos.

Foi o ano de Cate Blanchet e sua magnífica Carol. Não houve filme mais lindo que esse.
Foi o ano de Homeland, sem dúvidas. Com duas temporadas arrebatadoras, depois de um final incerto na terceira temporada. Carrie Mathison é ainda a personagem feminina de séries ‘modinhas’ mais forte, mais humana e consequentemente, mais complexa.
Foi o ano de Rainhas. Drag queens. Ano de Bianca del Rio e Violet Chachki. De Bob The Drag Queen e Chichi Devayne. De autoestima e amor próprio. Coisas que se aprendem quando você entra num universo tão rico, tão cheio de vida e alegria, tão cheio de arte, mas que noventa por cento da humanidade marginaliza, ridiculariza e se envergonha.

Foi o ano de Paulo e Estevão. De uma leitura que machuca a alma e ao mesmo tempo te levanta de qualquer lamaçal que tenha se enfiado.

Das estradas, claro, todas rumo ao Sul. Todas que me levaram à vida que eu escolhi ter de vez em quando. Que me levaram ao mate, à fogueira, ao amor livre e ao direito de ser quem você quiser ser. Eu era uma babá. E também muitas outras coisas que não convém citar aqui.
Ano das águas geladas do Uruguai, e ano das águas mornas do litoral paulista. Foram nove praias no total. Algumas montanhas e todos os nasceres e pores de Sóis possíveis e imagináveis.
Foi o ano de começar em uma escola de idiomas na Augusta. Foi o ano de largar tudo (de novo), aceitar um trabalho em Punta del Diablo e descobrir intimamente as belezas do Uruguai. E da Alemanha, da Turquia, da Espanha , da Holanda, e principalmente da Argentina. Tinha o mundo inteiro se reunindo todas as noites em volta da fogueira pra contar histórias. Voltando pras minhas terras, vivi. Tudo o que quis. Largaria tudo de novo pra viver tudo isso de novo. Nunca me abandonarei atrás de uma mesma mesa por anos e anos, estagnada e sonhando com uma vida que eu nunca vou ter. Nunca me deixarei dentro de um aquário observando o mundo que passa a minha frente. Nunca permitirei que o comodismo me impeça de viver. Nunca permitirei que os meus sonhos sejam podados pelos sonhos dos outros.

Foi o ano da paz e da leveza do perdão. Paz essa conseguida em trabalhos comunitários, em trabalhos de amor e uma tentativa (ainda que um pouco falha) de altruísmo. Paz essa conseguida depois de entender que do nada a gente pode deixar esse mundo. Então que sejamos os mais honestos que pudermos e que consigamos olhar um pouco pra fora do nosso próprio umbigo. Foi o ano da alimentação saudável e da tentativa de uma vida saudável. Nem tanto, nem sempre. Mas tentei.
Começo meu novo ano sem chefe, sem horário fixo, sem crachá. Livre das corporações, hoje trabalho com moda – mas prometo não me tornar fútil. Começo dando algumas aulas particulares, palestrando, fazendo consultorias, traduções, academia, crochê e sexo de vez em quando. 

Recomeço algumas parcerias perdidas com o tempo.

Já com duas viagens agendadas, começo redescobrindo estradas, mares e céus. Com algumas paixões no peito, vou levando a vida tentando não machucar ninguém. Principalmente a mim mesma.

Fotografei e continuarei fotografando. Sempre. Até o próximo ano. 

E que, de novo, ninguém me tire de mim.